Ouvi na televisão (televisão para mim é rádio) uma jornalista dizendo que o telefone, o objeto que faz trim trim e a gente atende dizendo alô, tou, hello, está em extinção.
Segundo a matéria, nos EUA, a já baixa média de conversa de três minutos por ligação caiu para um minuto.
Falar caiu. Não foi a linha.
O lance agora é ir direto ao assunto e por escrito usando um smart phone.
Smart phone é uma geringonça, um tipo de mutação telefônica portadora de Internet que se pode levar de lá para cá em um bolso da calça.
Internet, por sua vez, pode ser um sintoma, um vírus, uma doença.
Talvez uma síndrome.
Internet é praticamente um novo cromossomo.
O cromossomo I, criatura mais poderosa que o X e que o Y.
O cromossomo I estabelece que letras, setinhas, corações e um zilhão de novos sinais devem ser digitados quando A quer falar, falar não, entrar em contato, com B ou com C ou com quem for.
E nada de pensar em escrever à mão e usar um envelope e o serviço de correio.
Mão também está em queda.
Cordas vocais mais ainda, mesmo que permaneça em pé o fã clube dos papagaios, catorritas e outros passarinhos violados da Amazônia.
Mas esse é um outro assunto. Gaiolas ficam para depois.
O assunto é o silêncio.
Um novo tipo de silêncio.
A quietude de quem cala a voz e se pensa presente sem perceber a superficialidade das relações sem corpo no mundo moderno.
Dizer mundo moderno é uma coisa antiga.
Não sei como me referir ao atual porque sou cria do passado. Nasci no milênio das trevas.
Falta-me luz para dar a ele um nome.
Faltam-me os olhares, os cheiros, o toque, os gestos humanos de outrora.
E falta-me luz para me dar um upgrade.
Não me falta, no entanto, chama.
Eventualmente, sofro alguma pane e quase apago. Minha mecânica não é de primeira.
Minha curiosidade, sim.
De curiosidade em curiosidade, não mato o gato.
Monto é o meu quebra cabeças mesmo que entre as minhas peça exista um smart phone.
Eu tenho uma geringonça, mutação telefônica portadora de Internet.
Tenho e quase me deixei levar por ela.
Eu estive por um fio usando rede wireless.
Ia esquecendo que tinha boca.
Mas não me contentei em esperar menos de onde devo esperar mais.
E um a um abocanhei os meus desencontros.